Se se fala em uma nova era para a música angolana, Skit Van Darken é um nome que se recomenda, sobretudo para os amantes do Rap Horrorcore e Hardcore. O músico quase não é visto nos media convencionais, mas goza de popularidade considerável na Internet e, à surdina, vai se transformando na principal referência deste subgénero do Hip Hop.
Começou a cantar em 2010. Parte das suas produções figuram entre os mais destacados da lusofonia no subgénero. Entretanto, só no ano passado sua carreira passou a merecer a atenção do grande público, por causa do single “Angola Não Me diz Nada”, que viralizou nas redes sociais como se de um chavão se tratasse. O tema levou-o a representar a África no “La Crypte” do colectivo franco-canadense “Nekropolis”, promovido pela editora Lost Souls Army and Entertainment.
As qualidades artísticas do rapper estão evidentes no álbum “Il Lycathrope Vocifera La Sophia” e no EP “Extrema-Direita, ambos disponíveis nas plataformas digitais. Em 2022, voltará a colocar mais um álbum no mercado intitulado “Atom Age Vampyre”, centrado em questões de segurança cibernética, anarcocapitalismo, horrores da guerra moderna, economia, distopia, caosofia, práticas avançadas da Alta Magia Negra entre outros.
Controverso nas suas abordagens, a música de Skit Van Darken contrasta e ofende qualquer moral hipócrita. O artista de 25 anos deixa nesta entrevista impressões de que é uma voz que merece a atenção dos amantes do “ rap underground”.

Que história esconde o heterónimo “Skit Van Darken”?
Skit Van Darken é o nome que criei, escolhi e adoptei para mim mesmo como culminar de um processo rigoroso de busca pelo autoconhecimento e das chaves da minha relação com o micro e o macro-cosmo. Alcancei este nome por meio de várias sessões de práticas e “teorização” sobre preceitos de inúmeras correntes ocultistas e esotéricas, bem como como recurso ao método científico, pois, no final de tudo, é um nome que encerra uma tese. Alcançar o nome foi regozijante, pois era o materializar do meu “magnum opus”, enquanto Mago e cientificamente a personificação da tese de vida.
Como é que entra para o mundo da música?
Tive contacto com música desde muito cedo. Meu tio (falecido), desde os meus cinco anos ou muito mias cedo, levava-me consigo aos ensaios do grupo coral de que era corista, deixava-me tocar nas partituras que trazia à casa. Ao lado da residência onde eu mora existia um bar que tocava todos dias das 14:00 às madrugadas uma grande diversidade de música e eu acabei por aprender a cantar todas aquelas músicas bem como assimilar os fundamentos da música (ritmo, melodia, tons, etc.). Entretanto, foram os mass-media que realmente me introduziram ao Hip-Hop. Eu vivia com um primo que era ávido consumidor do Rap norte-americano (mainstream) e exímio amante da NBA, que carregava, naquela altura, uma atmosfera Hip Hop.
Em que circunstâncias decide levar a música mais para o lado profissional?
Apesar de inúmeras beats-tapes lançadas e um número significativo de demos e obras sólidas, eu sentia que não estava a fazer as coisas da maneira mais correcta! Francamente, sentia que existia todo um conjunto de pressupostos que os artistas que eu admirava levavam em consideração, mas que eu infelizmente não. Isso me fez estudar meticulosamente a teoria e praticamente a actualidade da indústria fonográfica e todos os seus processos. Mas, a ficha caíu quando após alguns sucessos dentro da bem restrita, mal-educada (financeira e profissionalmente) comunidade de fazedores e ouvintes do Horrorcore, decidi começar a lançar obras e colocar à venda. Foi assim que, após me terem confiado o lançamento do EP “Hentoxicação Pudrigáctica” do grupo “Grindblack Psychadelic”, do qual eu também era/sou integrante como beatmaker e já ciente da realidade, mantive o projecto em espera, enquanto buscava ter capacidade financeira para lançar da melhor forma.
Foi também a prtir deste momento que despertou o interesse em abordar problemas do país e alertar para a alienação cultural?
Quando estamos dotados de razão e lógica e vivemos em péssimas condições sociais causadas por outros entes da sociedade, nossa reacção primária e natural é suposto ser a contestação. Nunca me passou pela cabeça cantar sobre cenários de festas, banquetes, ostentação material e outros assuntos que estivessem distantes da realidade que me rodeava. Independentemente da arte que a pessoa exerça, seja ela, pintura, artes plásticas, etc. naquelas condições a arte produzida é sempre uma resposta ao ambiente externo. Minhas primeiras músicas no subgénero que represento, embora excessivamente técnicas e subliminares, nunca fugiram da relação estímulo-resposta.
Seu percurso artístico começa em 2010. Mas, foi a 11 de Novembro do ano passado que sua carreira suscitou mais interesse. O que ganhou da exposição mediática pelo tema “Angola não me diz nada?
Somei muitas relações boas e, graças à exposição mediática que o single trouxe. Estou a tirar partido destas novas relações de amizade, trabalho, sentimentais e de afecto de modo que possa alcançar o próximo estágio que é o da rentabilização efectiva das minhas criações; há muitos artistas com que gostaria de trabalhar dentro e fora do país; alavancar a minha intenção de carreira política: gostaria de formar o primeiro movimento libertário de Angola. Quero, igualmente educar os ouvintes sobre o Horrorcore e defender os interesses deste subgénero, bem como sua historicidade e contributo que foi fundamental para a sobrevivência do Underground Rap em Angola.
Entende-se que seja fortemente influenciado pelo Heavy Metal, mas que mensagem específica quis passar às pessoas com a música “Angola Não Me Diz Nada”?
A mensagem central desta música é: governos estão condenados ao fracasso o individualismo é a próxima forma de estado. Não importa se seus interesses são bons ou maus, se lutares por eles e dares sua vida por eles, prevalecerão sobre as dos que não fazem o mesmo. Com isto, quis deixar claro aos angolanos que não vale a pena nos escondermos por trás de formas-pensamento, arquétipos, egrégoras ou quaisquer outras formas de colectivismos (Repúblicas, províncias, etc…).
O dia em que cada um dos que habitam este território entender e aceitar que o bem-estar deles está em cima de tudo e de todos, o MPLA deixará de ser Governo. Este é o grande segredo. Quando um governo vigente não satisfizer as exigências de sua população, esta tem o direito de desobedecê-lo por meio da desobediência civil e acção directa que têm respaldo jurídico, e não precisam de leis para garanti-las. Porque são forma de expressão do direito de resistência, que é uma espécie de direito de excepção.
Apesar do carácter violento (própria do subgênero), “Angola Não Me Diz Nada” é, de forma indirecta, um exemplo de uma acção directa que deixa clara minha posição enquanto uma pessoa que defende ideais libertários, anarcocapitalistas que promovem a redução da intervenção do estado. E numa abordagem iconoclástica típica do horrorcore. Decipo, nesta letra, alguns dos princípios e entidades tidos por muitos como sacros quando, na verdade, são meras criações humanas, tal como é esta mesma música.
As mensagens da sua música podem ser confundidas como um apelo à subversão. Não receia que venha a ser acusado de incitar a violência?
Não receio isto nenhum pouco. Toda a gente sabe que os principais factores que incitam a violência neste país, e no mundo, são geralmente a desigualdade social, conflitos étnicos e religiosos, conflitos políticos, transtornos psicológicos, etc. A subversão para eclodir em Angola não precisa da minha música, a situação socioeconómica convida qualquer um a isso. A guerra que matou milhares de pessoas neste país e os massacres que aconteceram um pouco por todo lado em Angola não foram causados por uma música, mas sim pelos interesses de pessoas bem identificadas e supostamente com a melhor educação académica, na altura, e que hoje vagueiam livre e vivem melhor do que eu que sequer um cachorro já matei. Não foi uma música que desencadeou o 27 de Maio e não foi uma música que queimou e decapitou pessoas a sangue frio e de forma bárbara na Jamba savimbista. Não há fundamento para este discurso, e que fique claro pra aqueles que ousarem usá-lo: perante aos factos e a realidade, nenhuma burrice prevalece por muito tempo.
Minhas músicas são exímias obras primas de arte do Horror (ficção) comparáveis a clássicos do cinema como Human Centipede, Cannibal Holocaust, e outros filmes splatter ou gore que, deliberadamente, concentram-se em representações gráficas de sangue e violência. Estes filmes são baseados em textos como as letras que dão vida às minhas músicas. É a arte que escolhi fazer. Qualquer acusação neste sentido é uma afronta aos fundamentos da liberdade artística.
Além de cantor e letrista é produtor; detém a Skit Company Records e dirige a Fluxo Digital. Fale-nos um pouco sobre o seu envolvimento com o negócio da música.
A Skit Company Records é uma editora angolana independente fundada em 2010 por mim. Em 2016, a editora lançou uma coletânea intitulada “Sujo”, que juntou grandes nomes do Horrorcore e do Hardcore Rap independente mundial, como Chapa Blasfemo, Semdó, Sajko Psychobrat, Exorcistas Ocultos, Movimento Kampa Preta, Mimax Corpsegrind, Assassino das Palavras, U Ghoxmico, Phezty Humana, Guardião Poeta Mistiko. Há representantes oficiais da gravadora em países como Brasil, México e Moçambique.
Já a Fluxodigital é a empresa que mãe que detém a Skit Company Records desde 2017 quando a absorveu. A Fluxodigital presta serviços de design gráfico, produção e pós-produção, desenvolvimento Web (criação de websites e aplicativos), infografismo, sonoplastia e Sonorização, marketing digital e assistência técnica.
A propósito, por que diz que odeia os angolanos e que sua música vale muito mais que o Hino Nacional?
Porque angolano é aquele que vestiu a camisola da angolanidade, que é uma criação do regime colonial português. Angola é o nome de um projecto de uma colonial que os portugueses conceberam na Europa e implementaram em África com ajuda da mão de obra local e trabalho escravo e apoio da Igreja Católica Romana em terras africanas habitadas por kongos, ovimbundus lundas, mucubais, khoisans, etc.. Este projecto foi oficializado por potenciais ocidentais entre 15 de Novembro de 1884 e 26 de Fevereiro de 1885 na Conferência de Berlim.
Infelizmente, por razões conjecturais os portugueses não puderam continuar com o projecto, tendo a condução deste posteriormente sido disputada por 3 movimentos locais (FNLA, MPLA e UNITA) encabeçados por 3 cidadãos locais oriundos de 3 povos diferentes destas nações locais. Actualmente o projecto é conduzido pelo MPLA e existe por aí uma miríade de outras organizações semelhantes (partidos) a tentarem tomar o controlo sob o argumento de que farão melhor. Reiterando a minha liberdade de opinião, eu digo que o hino nacional de Angola é ruim de se escutar, a letra referência um monte de coisas que não têm nada a ver comigo nem com a realidade que eu e muitas outras pessoas não vivem. Se calhar, fazia sentido na altura que foi escrito (mas não creio). Já nos dias em que vivo, posso garantir que não faz sentido algum, parece mais uma trilha sonora tirada de um filme de propaganda comunista do que qualquer outra coisa. Não me comove a cantá-lo, tal como quaisquer outras músicas que não fazem meu gosto. O ritmo é belo, mas a letra é simplesmente utópica demais para mim.
Que Skit Van Darken teremos para frente?
Um Skit Van Darken mais presente, mais profissional, mais comunicativo, mais afável e amigável à grande imprensa, mais viajados (quero poder viajar bastante por causa da minha música), um Skit aberto ao debate de ideias e opiniões, cada vez mais sátiro e violento (no bom sentido claro).