Acaba de ser inaugurada, na galeria da Fundação Arte e Cultura, a exposição que marca a estreia a solo de Leandro Marques. Isenta de um tema condutor, a mostra, `Eclosão´, coloca o dedo na ferida de uma multiplicidade de assuntos, questionando desde a masculinidade tóxica aos padrões de beleza impostos pela sociedade.
Tal como lhe definiu o também artista plástico Eduardo Vueza, a obra de Leandro traz estilo próprio e convergência na visão, na técnica e no acabamento harmonioso. Facto este, que poderá ser comprovado na exposição composta por 14 obras, duas das quais em colaboração com o artista Adilson Vieira, e estará patente até ao dia 26 do corrente mês.
Leandro Marques, ou simplesmente Marques, nome com que se vincou no universo das artes plásticas, já figurou em outras exposições colectivas “No silêncio a arte fala”, “A Fonte”, “Untitled.2” e “Reunir”.
Após passar por muitas exposições colectivas, como é para si estrear-se a solo, ainda mais num contexto pandémico?
Expor a solo num contexto pandémico tem um sabor agridoce, sabemos todos que os museus e galerias de arte andaram fechados por conta deste período, para nós, os artistas foi muito difícil porque é das exposições onde vem o nosso sustento, então, houve a necessidade de se reinventar e até fazer outras actividades para que não houvesse greve de panelas em casa (risos).
Mas também foi bom, porque particularmente, aproveitei esse período para produzir, só para ter noção 90% da produção desta amostra (Eclosão) foi feita nesta fase e venho sedento por expor estes e mais outros trabalhos futuramente, pois eu, continuo a produzir.
Em que aspectos o Covid-19 influenciou a sua arte?
No princípio da pandemia, quando havia pouca informação acerca do vírus SARScov19, houve muitos alarmismos, o medo literalmente dominou o mundo, eu vivi um período sabático que durou cerca de 3 meses e foi o maior impacto, diga-se negativo, para a minha arte.
Qual foi o tempo que necessitou para a concepção da exposição?
Tive cerca de 4 meses para concepção desta exposição, mas em concílio com outras actividades ligadas à arte.
Do que é feita a exposição Eclosão?
Na verdade, a exposição é muito sobre mim, enquanto artista, o meu olhar sobre alguns fenómenos actuais e até uns mais antigos. Não tenho uma linha condutora porque os temas são aleatórios e diversificados, então, eu trago abordagens, como por exemplo, a masculinidade tóxica, falo de pessoas que com algum talento, sentem-se presas e não conseguem mostrar à sociedade, também faço questionamentos acerca de padrões físicos corporais… em suma, a exposição terá vários temas a serem discutidos.
O que mais potencia a sua criatividade?
As pessoas, os fenómenos sociais são, em si, a minha fonte de inspiração/criatividade
Sendo homem, como lida diariamente perante homens tóxicos?Actualmente lido com indiferença e nalguns raros casos tento uma intervenção apelando à consciencialização. É importante referir que por conta do sistema patriarcal, as sociedades do mundo inteiro criam homens machistas, intolerantes… tóxicos e eu não sou a excepção, apenas vou ganhando consciência e cada vez menos reproduzir tais negatividades.
Como consegue identificar os sinais?
São inúmeros os sinais, um dos mais frequentes por exemplo é a maneira depreciativa com que os homens reagem ao lidarem com mulheres que falam abertamente sobre sexo.
Até que ponto os homens chegam a ser vítimas dos seus semelhantes?
A vitimização ocorre nos primeiros anos de vida, na infância, no seio familiar, com ensinamentos do tipo: homem não chora, homem não veste rosa, homem não brinca com bonecas, homem não faz trabalhos domésticos, etc.
Quantas obras e quais as técnicas patentes?
Para esta amostra tenho 14 obras, duas das quais feita em colaboração com o meu colega e amigo Adilson Vieira. As técnicas são variadas, usei acrílico, óleo, carvão e café.
Frisou que usa a técnica do café, em que consiste este processo?
Uso essencialmente para dar um efeito envelhecido à pintura.
Sabe-se que é um autodidata, que factores teve como base na sua formação artística?
Sendo um autodidata, faço estudos independentes e muitos experimentos, acompanho muitos artistas nacionais e internacionais que me inspiram.
Houve alguma influência externa de outro profissional do ramo?
Sim, houve influência externa, mas não directamente. Quando vejo algo fantástico feito por um outro artista, dificilmente pergunto como é que ele trabalhou até chegar àquele resultado, ao invés disso, vou fazendo experimentos para que não seja exactamente igual.
Pode falar-se de um verdadeiro mercado de arte em Angola?
Eu penso que há sim um mercado de arte em Angola, porque os artistas vendem… talvez falte-nos mais intervenção do nosso governo para que se crie uma indústria funcional.
Está associado ao atelier kores, considera a venda de obras de arte num bom negócio?
Bem, o Atelier Kores é uma concepção minha e com a parceria do meu colega Adilson Vieira. Pintamos quadros para pessoas comuns, pessoas que apreciam antes de tudo o belo, desse jeito o valor dos quadros são muito reduzidos, mas em contrapartida temos mais frequência de clientes, é do trabalho feito na Kores onde sai o sustento para a produção de obras para as exposições. O objectivo é fazer crescer o atelier e torná-lo num bom negócio.