O álbum «O Homem e o Artista» de Keita Mayanda, representa a verdadeira face do Hip Hop angolano e define as várias etapas do desenvolvimento do homem, enquanto ser pensante. De igual modo, seu autor procura, através do mesmo, despertar a consciência do angolano, marcando seu posicionamento no Rap lusófono.
A referência é mais evidente no imaginário popular, dado que, a actual geração de rappers é menos focada na geração anterior e dela raramente aprende alguma coisa.
Hoje faz 15 anos desde que foi lançado. O disco continua a ser protótipo do Hip Hop nacional. Contribuiu para o bem imaterial, felicidade e educação do homem angolano.
Ao assinalar mais um aniversário, Keita preparou o lançamento / venda simbólica de t-shirt comemorativa e, acidentalmente, publicou álbum remixes do seu último lançamento “7 Momentos de Lucidez”.
Em entrevista à Carga, Mayanda conta se vai ou não reeditar a obra; em que aspectos mais o beneficiou; e da influência que «O Homem e o Artista» exerceu na actual geração de rappers.

“O Homem e o Artista” e os “7 Momentos de Lucidez” definem diferentes períodos da carreira de Keita. Por que razão juntar à celebração o seu novo álbum?
É mais uma coincidência do que um objectivo. O álbum de remixes estava na fase final de produção e faz sentido lançar em julho. O mês de julho é especial para mim, além do O Homem e o Artista, eu lancei nesse mês há 4 anos o EP, Músicas Para despertar e Motivar em Tempos de Incerteza e lancei a minha marca de roupa há 2 anos.
A obra define e traça bem as diferentes fases do desenvolvimento do homem enquanto ser pensante. Que opinião tem hoje sobre o homem e o artista angolano?
Isso é uma pergunta de um bilhão de kwanzas. O homem angolano ou melhor, o ser humano angolano é um ser perdido, com uma cultura que se desvaloriza e se perde porque não se ensina e, portanto, não se valoriza e não pode competir com o que há de melhor no mundo. É um ser faminto de tudo, sobretudo de boa governação e de perspectivas de um futuro melhor. Acho que colectivamente esse momento é um dos piores dos últimos 30 anos, social e economicamente e em grande parte deve-se ao facto de termos tão maus governantes que tudo nos parece uma experiência dantesca. O artista angolano é um ser em experimentação, eu fico feliz por ser da minha geração de artistas. Experimentámos sonoramente, criámos uma escola de pensamento e estética musical, não sei o que vem aí, mas eu sei que na minha geração existem heróis da cultura angolana.
É um álbum que acabou por projectar ainda mais a imagem de Keita Mayanda. Em que aspectos mais o beneficiou ?
Eu não sei se realmente posso falar em benefícios, ser famoso ou conhecido em Angola nem sempre é uma bênção e isso é provavelmente a coisa mais evidente que resultou de eu ter lançado esse disco. O álbum é um clássico, mas não me trouxe riqueza ou conforto material. Acho curioso as pessoas sempre perguntarem a um artista pelo próximo disco, principalmente aquelas que o obtiveram de downloads ilegais ou porque um amigo deu num pen drive. Artistas serão sempre indivíduos com fome num país onde a iniciativa privada depende do dinheiro público, cultura é um bem imaterial, mas fundamental para a felicidade e educação de todos, choca-me como tão pouca gente se digna a pagar por shows ou comprar merchandising ou álbuns, principalmente de artistas não tão populares ou que não aparecem na grande mídia.
Olhando para o que se tem produzido actualmente, acredita que a nova geração aprendeu mais com o seu primeiro álbum?
A actual geração de rappers é menos focada na geração anterior e dela raramente aprende alguma coisa. Cada geração tem os seus heróis e os seus detractores. Há uma desconexão e não é apenas porque o novo se tenta sobrepor ao antigo, creio que existe mesmo um desconhecimento do que existe há 30, 20 anos na música rap nacional.
O álbum é um clássico para o Rap nacional e, obviamente, muitos desejavam obter uma cópia. Qual a possibilidade de voltarmos a tê-lo no formato físico?
Como muita gente deve saber, não se produzem cds em Angola, mesmo com o boom que se deu com o lançamento de cds e o surgimento de muitos novos artistas e editoras nos últimos 18 ou 20 anos , nunca se produziu cds em Angola. Actualmente com os entraves que existem a nível da banca para se conseguir moeda estrangeira; a desvalorização do Kwanza, a produção de um cd é um projecto hercúleo e que não compensa, na cabeça de muita gente um cd ainda deveria custar 1.000 kwanzas isso é impossível hoje, eu nem faço ideia de qual seria o preço final de um cd para que fosse realmente interessante passar por todas as dificuldades, principalmente falando de um álbum que foi lançado há 15 anos. Eu não sei quando será possível reeditarmos esse álbum.
Sobre o álbum
Lançado em 2006, O Homem e o Artista é a obra de estreia de Keita Mayanda. Comporta 16 músicas resumidas em 51 minutos. Reúne participações de Edu ZP, MCK, Flagelo Urbano, Ikonoklasta, Leonardo Wawuti e produção de Leonardo Wawuti, Conductor e NK.