A literatura direccionada ao teatro receberá mais três títulos no próximo dia 6 de Julho, A Raiva, A Grande Questão e o Teatro Da Tarimba. Tratam-se das primeiras obras em livro do autor, após tê-las adaptado em peças teatrais e publicadas em DVD.
Nas obras não descritas como trilogia, mas que por sinal se completam, o teatrólogo angolano espelha o estudo científico da nossa realidade, no que ao teatro diz respeito e, é destinada ao público amante da arte, do teatro em particular, estudantes, jornalistas culturais e a sociedade em geral
A serem lançadas numa cerimónia que terá lugar na União dos Escritores Angolanos, na data acima citada, foram editadas pela Metabooks (editora brasileira sediada em São Paulo) e veem sendo preparadas desde 2010. O produto final é uma mais valia para o teatro, pois não é praxe o lançamento de obras dramáticas em livro e tampouco se fazem estudos sobre teatro que versam a realidade desta arte de resistência.
À Carga Magazine, o autor explicou que elas diferem na forma e conteúdo: A Raiva e A Grande Questão são obras dramáticas e abordam a problemática sociocultural, política e económica do país, particularmente da cidade de Luanda. Estas duas obras já foram publicadas em DVD e vendidas na Praça da Independência em 2010, para além de já terem sido vencedoras do prémio cidade de Luanda (2009 e 2010, respectivamente).

Como surge a oportunidade de lançar três obras em condições atípicas… num contexto pandémico em que está tudo mais difícil?
De facto nunca houve apoio, nem condições para que fossem publicadas anteriormente em livro. Em 2018 quando terminei a minha licenciatura em teatro, enviamos o trabalho final à editora metabooks e, eles aprovaram as 3 obras. Fomos em busca de apoio, durante este período de pandemia e a obtivemos através da Sociedade Mineira de Catoca, a Fundação Brilhante, a ACHE, a Tipografia Corimba e outros parceiros, que deram-nos percentagens do valor global que solicitamos, que juntando tudo serviu para que pudéssemos pagar a impressão, diagramação e revisão dos livros. Ter hoje os livros em mãos só foi possível graças a esses apoios em cima mencionados.
Quanto tempo necessitou para a concepção das obras e quais as maiores dificuldades?
A Raiva e A Grande Questão já existiam como obras de teatro, encenadas em palco há 10 anos. Para a sua concepção em livro levou 2 anos. Já o Teatro Da Tarimba, o meu trabalho de licenciatura, levou 7 anos de estudo e preparação, até o formato final em livro. As grandes dificuldades foram encontrar apoios (financeiros e documental) durante as pesquisas. Poucas pessoas estão dispostas a apoiar pesquisadores, principalmente na área da cultura – das artes precisamente.
Todas elas são destinadas a ala artística ou ao público em geral?
Apesar de serem obras de arte, teatro, elas podem ser consumidas por um público heterogéneo. Pois nelas contém a história do povo angolano. A sua identidade, a sua cultura, e muitos dados importantes, relevantes mesmo, para consulta e ajuda na explicação e resolução de fenómenos culturais da nossa sociedade. Obviamente que a classe artística e os académicos terão maior interesse nelas.
Podemos considera-las como `Guias básicos da matéria teatral´ com conteúdo didático ou trata-se apenas de relatos da sua visão, experiência e trajectória?
O Teatro Da Tarimba é um manual de estudo para análise teatral. Talvez seja o primeiro em Angola com a profundidade que se apresenta. Para além de Mena Abrantes que tem feito já vários estudos sobre o teatro angolano, este nosso trabalho é o mais recente e didático que está sendo publicado para todos os artistas.
Como avalia o teatro que se faz a nível nacional?
Ainda não temos um teatro nacional na acepção do termo “Nação”. Um teatro que instiga os fenómenos da nossa cultura e que funciona como um verdadeiro veículo de exaltação da angolanidade. Este teatro existiu nos anos 80 com o casamento que se verificava com a literatura de Pepetela, Costa Andrade Ndunduma, Manuel Rui Monteiro, Uanhenga Xito, Óscar Ribas, José Mena Abrantes e outros Escritores da época. Hoje o que se verifica é um divórcio do teatro com a literatura, o que de certo modo, belisca o valor axiológico que esta disciplina artística aufere e, concomitantemente, desvaloriza, com o actual teatro praticado, de pouca profundidade filosófica e estética, aquilo que deveria ser chamado de Teatro Nacional.
Que factores estão aliados a isto? Aliada a isto, há um conjunto de factores que em nada contribuem para que se possa dirimir a problemática do teatro em Angola; a falta de políticas claras e pragmáticas, as poucas e degradadas infraestruturas existentes, a falta de formação de qualidade, a falta de incentivos e promoção das artes, e outros tantos factores que relegam o teatro a condição de produto não rentável para a economia do país. O que existe, de acordo com Mena Abrantes, é a vontade dos fazedores de teatro que conflitua com todas as dificuldades que fizemos referência em cima. É, também, por esse motivo que o nosso estudo denomina-se Teatro Da Tarimba.
E o estado de estudos científico desta área, em que pé anda?
Como disse também anteriormente, quase não existe estudos científicos nesta área. Mena Abrantes é um dos poucos. Temos também a Drª. Agnela Barros, o Prof. Africano Kangombe e talvez mais alguns na floresta do mayombe. Por isso, nós, enquanto um dos primeiros quadros formados em Angola nesta área, estamos preocupados com a situação e, de maneira a contribuir na resolução do problema, estamos a lançar estas obras, que muito ajudarão a colmatar a lacuna existente.
Em meio às adversidades que citou acima, qual é então o balanço que faz dos seus muitos anos dedicados a arte?
Positivo. Hoje sou formado e especialista na área. Sou profissional há 28 anos. Sou professor da Faculdade de Artes e do Instituto Superior Politécnico Metropolitano de Angola – IMETRO. Não me sinto realizado, por isso continuo frequentado o mestrado em Literatura no Instituto Superior de Ciências da Educação – ISCED – Luanda. O objectivo mesmo é poder viver da arte como um profissional da saúde ou educação vive, auferindo um salário digno.